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Sinto que nunca a agarrei, com unhas e dentes para alcançar objectivos ou vivências, nunca bebi sôfrega os dias que ela me traz, nunca a almejei maior, mais preenchida, objectiva e contundente, num remoinho de paixões e conflitos que nos elevam para lá de nós próprios e nos trazem novo alento, mudanças e uma nova vida.
Sinto-a por vezes lancinante, visível e a querer mais e muito mais de mim, mas eu nunca lhe correspondi, porque me foi bruta e malvada há anos, mas muito anos idos e eu nunca lutei contra ela, nem me opus, apenas sobrevivi. Vesti esse paradigma da sobrevivência quase até hoje, fizeram-me ter consciência disso, e disseram-me que por vezes a vida pode ser assim má, mas pois que sobrevivi e agora, num volte face sobre ela própria me daria oportunidade de ser mais e fazer mais dela, desta vida.
Mas eu, eu continuo a vê-la decorrer, dia após dia, ano após ano, esta vida que é minha, que se defuma perante mim, sem nunca a ter agarrado e bebido dela verdadeiramente.
Até quando?
Lá fui eu pela manhã, com um cestinho com alguns dos ingredientes, outros já estavam na sala à minha espera, tive direito a autocolante na roupa com um "VISITOR" bem visível e acompanhante a cada momento.
Entra o primeiro grupo 16 criaturas, entre elas o meu filho que me falou em português e ficaram todos a olhar para ambos com ar muito espantado, por não perceberem nada do que fora dito!
Puseram todos um avental à medida de cada um sentaram-se e estiveram com atenção, fiz com que o alguidar com a massa circulasse por todos, fomos acrescentando os ingredientes, quando a massa ficou pronta, distribui pedaços de massa por cada um, fizeram bolinhas que entusiasticamente besuntaram de canela em pó, pusemos no tabuleiro de ir ao forno e seguiram viagem.
Entra o segundo grupo, mesmo procedimento, aventais, sentarem-se, fomos pondo ingredientes e mexendo, mas acontece que nos bolinhos de coco a massa ficou muito, mas mesmo muito líquida, acrescentei imensa farinha, até que achei que tinha consistência para moldarem bolinhas, engano!
É que mãos de crianças com quatro anos, não têm a desfaçatez das minhas, em vez de fazerem bolas apertaram a massa, era massa de bolos de coco por todo o lado. Claro que ninguém se atrapalhou, antes pelo contrário, houve quem quisesse comer a massa assim, outros que a esfregaram pelas mãos fora...
Pedi se podiam lavar as mãos e regressarem, enquanto isso com ajuda de colheres coloquei montes de massa nos tabuleiros.
Quando regressaram foi só distribuírem as cerejas pelos topos da massa e saíram.
Agora ao final do dia, foi com contentamento que vejo cada um deles sair com um saquinho com um bolo de cada lá dentro, muito satisfeitos e a relatarem a peripécia aos pais.
A professora agradeceu-me e mencionou o nosso laborioso trabalho desta manhã, na informação que envia na mala de cada um deles, quando é necessário informar os pais de algo.
Estou satisfeita por ter saído do meu casulo e ter feito alguma coisa, por mim e por ele.
A repetir certamente!
Hoje parece que é o European Day os Languages, houve celebrações na escola do meu filho, fomos convidados a fazer um poster sobre um país da união europeia, com a bandeira e algumas particularidades como: palavras, vestes e pratos tradicionais. Hoje as crianças poderam ir vestidas com cores nacionais desses países, ou levarem mesmo um traje, além de que também poderiam partilhar petiscos do país escolhido.
Nesse âmbito a professora convidou os pais nativos de outros países europeus que não a Inglaterra para irem lá à escola, dizerem umas palavras na sua língua nacional, ler um livro ou cozinhar um qualquer prato nacional.
Ora eu, mulher de tachos e panelas, doces e salgados propus-me à tarefa de cozinhar com os miúdos, assim sendo amanhã, rumo à escola para fazer bolos com 30 crianças!
Vamos dividi-los em dois grupos, o primeiro fará bolinhos de canela, ou segundo bolinhos de coco...
Hoje ao perguntar a que horas deveria estar na escola, pediram-me que quando entrasse me dirigisse à secretaria, teriam de me fazer um cartão de visitante e alguém me irá acompanhar durante todo o tempo que eu permanecer nas instalações, isto porque não tenho o meu registo criminal para ser verificado.
Percebo que isto é para salvaguarda das crianças, ninguém está em contacto com elas, sem perceberem previamente o histórico criminal da pessoa (algo muito comum e usual por aqui), mas dizerem-me isto assim na cara friamente, fiquei, no minímo constragida e com uma sensação de estranheza...
Mas adiante, com registo criminal, sem registo criminal, amanhã alguém vai ter uma manhã muito diferente e não, não são só as 30 crianças....
De um país que eu não conheci, onde havia oportunidades de emprego, para todas as áreas, às quais nos podíamos candidatar, onde era possível trabalhar na área que tanto almejávamos, depois de terminar uma licenciatura, ou uma qualquer formação, sem necessidade de andar a bater às portas, a enviar 1500 candidaturas espontâneas, sem resposta, onde se ia a entrevistas, várias numa mesma semana...
De um país que era nosso, onde falávamos a nossa língua, onde era possível sonhar, ter casa, viver condignamente, poder ir ao cinema e jantar fora de vez em quando...
Tenho saudades de um país onde pudesse ter a família e os amigos reunidos, onde era possível fazer festas de aniversário com todos sentados à mesma mesa...
Tenho saudades de um país que me parece longínquo, distante, cada vez menos meu e de onde surgem campanhas publicitárias, muito bem feitas, com música, palvaras e números com muito sentido, mas que a mim me deixam saudades, porque me parecem não fazerem sentido nenhum...
Numa das paredes da cozinha está um armário com uma única porta, sozinho, tem lá dentro o esquentador (ou terá outro nome técnico?) do aquecimento central a gás que temos em casa.
Por lei, os aquecimentos são sujeitos a revisão anual por um técnico patenteado para o efeito e hoje foi o dia, perguntou-me onde estava a caldeira, e seguiu-se o denominado esquentador, abre a porta, inspecciona tudo à volta e exclamou que não podia ser! Fez força no armário e puxa de um lado, puxa do outro, e eu a olhar atónita sem perceber nada do que se estava a passar.
Eis senão quando o senhor se vira para mim e me diz que para tirar a tampa do esquentador, precisava de desapertar uns parafusos que estão por debaixo da tampa e para aceder aos ditos, pasmem-se...teria de tirar o armário da parede!
Sim leram bem, é preciso tirar o armário da parede anualmente para poder fazer a revisão do equipamento!
Inacreditável!
Perguntou-me se eu já aqui estava a morar quando fizeram as obras e colocaram aquilo, eu disse que não, ainda nem há um ano que moro aqui!
Diz-me ele que alguém não fez o trabalho como deve ser!
É o mínimo que se poderá dizer de tal situação!
Agora olho para aquele armário, sozinho numa parede da minha cozinha, só com uma porta e penso, estás aí só para inglês ver!
Hoje foi a cerimónia de acolhimento dos alunos mais velhos aos mais novos na escola primária, onde anda o Simão.
Por regra, é atribuído a cada um dos alunos do último ano da escola um "buddy", um amigo do primeiro ano, com o qual brincam, fazem actividades na sala, enfim, ajudam a acolher e a integrar na escola. Ao Simão, foi atribuída uma menina portuguesa, parece que quando quando há essa possibilidade, juntam as mesmas nacionalidades, o que para nós foi óptimo!
Hoje lá fui, deixie-o na sala, fui para o auditório, onde entraram os restantes alunos todos e no fim, os mais velhos acompanhados do seu amigo do primeiro ano. Cada um apresentou o seu buddy, dizendo o nome, a cor preferida, bem como actividades que gostam de fazer ou o que querem ser no futuro, e entregaram um certificado, dando as boas vindas.
Houve momentos marcantes, como a entrega de cada um deles das suas expectativas e sonhos num cartão, de frente a um altar que fizeram na sala, a oração de agradecimento e de protecção para todos e cada um, um cântico dos mais velhos de acolhimento e por fim um cântico final.
A máquina fotográfica encravou no momento crucial, não prestei atenção devida ao que foi dito acerca do meu filho e senti-me só, ninguém com quem partilhar este rol de emoções, uma cara que fosse conhecida, um sorriso partilhado pela alegria dele, os acenos que ele me dirigia, ninguém...só eu...
É sem dúvida muito nestes pequenos grandes momentos, que ser emigrante custa, que exige um estofo enorme, que por vezes não sei se compensa...
Acho que o desgaste físico próprio do avançar da idade, bateu-me à porta e trouxe com ele a falta de paciência e muita procrastinação.
Ando a (tentar!) fazer limpezas a fundo cá em casa, era suposto ser na Primavera, mas digamos que com a presença da pequena criatura, não daria grande jeito, até porque quer "ajudar" sempre em toda e qualquer tarefa doméstica, o que por vezes, convenhamos, só atrapalha.
Como agora está o dia todo na escola, tenho tempo livre de sobra para organizar tudo isso.
Encabecei a semana na terça-feira e dei início às lides, pensei que um dia por semana para uma divisão da casa seria suficiente, erro crasso!
Levei dois dias na cozinha, entre tirar tudo dos armários, limpar e voltar a pôr, limpar paredes e janela, (e jogar candy crash saga!) passou-se, além de que depois das 15h pouco ou nada faço, adivinham o motivo?
Ontem ainda dei um jeito nos arrumos que temos no andar de baixo, o denominado quarto do Harry Potter, porque fica debaixo das escadas de acesso aos segundo andar e limpei a porta e respectiva janela da sala que dão para o jardim das traseiras.
Hoje, acordei com uma dor no joelho direito, que não me facilita os movimentos, subir e descer escadas então piora drasticamente.
Tenho um desvio de alguns milímetros em ambas as rótulas, coisa com a qual convivo bem, a não ser quando, como hoje se lembram de que não posso só fazer o que a minha cabeça manda!
Por isso, joelheira correctiva posta, spray anti-inflamatório, balde na mão e aí vamos nós!
Contra a dor, limpar! Limpar! (E pausas para jogo )
Pequeno Simão já começou a semana passada a frequentar a escola das 8h50 ao meio-dia, esta semana já a tempo inteiro das 8h50 às 15h, fazendo uma refeição na escola. De frisar que ele tem quatro anos de idade.
Ontem, teve aula de educação física, sendo que teve de despir o uniforme e vestir o equipamento necessário (calções, t-shirt e uns ténis de pano).
Quando chegámos a casa e ele se mudou de roupa reparei que a única coisa que estava bem, era a gravata e a camisa, coisas que ele não consegue vestir sozinho, pelo que precisou de ajuda para tal, o resto, ou estava do avesso, ou de trás para a frente, como as calças, sim...as calças de trás para a frente!
Ele leva a lancheira com o almoço, hoje fiz uns enrolados de massa filó, com carne e vegetais lá dentro, chegou a casa com metade do enrolado na lancheira, completamente atirado lá para dentro, só ele poderia ter feito aquilo, juntamente com o guardanapo. Traz a boca com uma mancha avermelhada a toda a volta, fruto de algum molho que o enrolado tinha...Sinal de que nem a boca lavou ou limpou no final de refeição.
Reconheço que são apenas três pessoas adultas na sala, entre professora e auxiliares e que tudo o que fuja à rotina da sala de aula, como o vestir e despir equipamento ou a hora da refeição devem ser momentos complicados e que o meu filho dificilmente pedirá ajuda para fazer o que quer que seja, nem tem iniciativa para determinados comportamentos como seja lavar as mãos e a boca no final de uma refeição, a não ser que seja solicitado veementemente para tal.
Fico sempre contrita quando me deparo com estas coisas, como se o meu pequeno filho (mãe galinha a falar) fosse entregue na selva e não tivesse instrumentos, nem meios para se desenvencilhar por lá.
Na realidade ainda não tem e há muito caminho a percorrer e muitas directrizes a dar-lhe, até que ele esteja não só integrado, mas com um comportamento mais cívico e polido, contudo sinto algum desamparo no outro lado, neste tipo de situações...
Gostava de estar a fazer as malas para rumar até "à terra" podia ser a casa dos meus pais, ou dos meus sogros, é-me indiferente, desde que estivesse com eles, sol e claro a nossa comida.
O que atenua tudo isto, é ser sexta-feira, é que esta família está mesmo a precisar de dois dias de pausa...
Acabei de ver um vídeo no Facebook das habilidades do cão dos amigos que estão a viver na minha casa em Lisboa, não senti aperto no peito, saudades, nada...
Acho que já me desliguei de lá, não faz sentido estar agarrada a algo que já foi e não voltará a ser, nem tão depressa, mas sobretudo nas mesmas condições (espero eu!).
Estranho este vazio de sentimentos, por outro lado gostei do móvel de arrumação que colocaram lá!
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